sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Viagem no tempo*

A

Amanhã é o grande dia. Os cálculos estão feitos, o material separado, falta muito pouco. As estrelas ostentam um convite para o passado, brilho incandescente povoando os sonhos dele.

B

Banana no café da manhã, o trânsito pelo espaço sideral é complicado, elimina micronutrientes do corpo. Ansiedade, dor de barriga, em poucas horas estaria atrás de tudo. Por garantia, pega mais uma e segue para a sala principal.

C

Corredores verde-hospital separam do dormitório a sala principal. O ar de doença incomoda mas não o impede; o que estava para acontecer era o grande sentido da sua vida.

D

Denise aguarda na sala principal junto com mais 10 pessoas. Toda a equipe estava ali, operação secreta do governo financiada com dinheiro de impostos e maquiada enquanto lançamento de satélite.

E

Encontra-se com Gia, a precursora macaca que fizera a viagem antes dele. Macaquinha corajosa, voltara 20 anos no tempo e voltou para o tempo presente. A memória não parecia ter sido afetada, e o corpo sofreu leves alterações, deficiência de nutrientes e um leve desgaste dos ossos em função das mudanças de gravidade. Acaricia a cabeça de Gia e escuta pelo milionésima e ultima vez Denise explicar os procedimentos.

F

Fadiga. Era o que sentia depois de quatro horas de reunião. Estava nervoso, não negava, mas a equipe parecia mais ansiosa que ele.

G

Gia remexia nos cabelos dele como se buscasse piolhos. A medida que o tempo passava ela parecia mais triste. Estaria ela com saudades dele ou com saudades da viagem? Ou ainda, seria medo?

H

Hora determinante. O equipamento está montado, o traje vestido, ele esta sentado na cabine do piloto. Estavam 45 minutos adiantados, e isso era fundamental. Caso se atrasassem só poderiam tentar de novo em 3 anos.

I

Incomodado ele se remexia na cadeira. Tinha pedido a Denise que fizesse uma cadeira mais confortável, mas ela disse que era impossível. Era quase inadmissível passar tanto tempo sentado ali. Hunf, impossível, não era ela que iria ficar três dias sentado ali. “Não se sente nada quando se esta viajando no hiper-espaço querido”. Claro, claro, estaria completamente duro ao chegar de volta.

J

Jocosos pensamentos para espantar o medo. Tanto fazia o conforto da cadeira. Tinha medo mesmo era de se dissolver ao tentar passar pelo buraco de minhoca.

K

Káons brilhantes formavam uma trilha semelhantes aos tijolos amarelos do mágico de Oz. Era impossível não vê-los através do equipamento... Será que depois de atravessar encontraria um homem de lata ou uma bruxa má?

L

Lançamento. Barulho do motor, pressão sobre a cabeça, calma para manipular os controles. Longos minutos até estabilizar uma velocidade de trajeto. O rumo estava certo, a entrada do buraco de minhoca estava a alguns anos-luz dali.

M

Medo de morrer. Achava que o buraco era invisível a olho nu, mas a poeira cósmica em volta dele o tornava visível e assustador, parecia uma enorme boca pronta para engoli-lo. Gia sumiu por 32 horas segundo os marcadores. Esse buraco era maior... passaria cerca de 50h dentro do monstro, sendo digerido até conseguir sair do outro lado. Medo.

N

Nave sendo sugada, os controles precisavam estar perfeitamente certos para que ele não batesse nas paredes do buraco e se desintegrasse. Perfeitamente reto, pro infinito. A pressão era enorme, desmaiou.

O

Ouvia um zumbido sinistro meio sonho meio realidade. Não conseguia esboçar nenhum movimento, completamente entregue a enorme gravidade. Achava que via os marcadores, a nave estava quase cedendo.

P

Perigo, luzes vermelhas, sirene e vapor. Não resistiria, alguma coisa tinha dado errado. Quanto tempo já teria se passado?

Q

Queimando, tudo parecia estar queimando. A dor alucinante transcendia o seu corpo e chegava até o espírito. Queimando. Apagou.

R

Respirava ainda. Não podia abrir os olhos, mas sabia que estava vivo. O ar cheirava a metal fundido e combustível, mas estava vivo.

S

“Santo Deus, o que eu estou fazendo aqui?”. Soltou-se da cadeira, a mente completamente confusa.

T

Tateou o teto buscando uma maneira de se soltar. Estava num deserto, sem nenhuma pessoa por perto para ajudá-lo.

U

Úmero estava machucado, devia ter quebrado durante a viagem. A memória voltava aos poucos, confuso como se tivesse de se esforçar muito para encontras as palavras num oceano difuso. As informações anotadas ajudavam, mas mesmo a leitura parecia acontecer num terreno sinistro.

V

Vaudeville a respeito de uma filha de comerciante que se apaixona por um pescador. Não gostava de literatura, não gostava mesmo. Sequer se lembrara de ter lido a respeito disso quando folheou livros de história do século XVI.... Mas então como...? Como lhe parecia tão evidente as roupas e as canções? Efeito da viagem? Como um distúrbio espaço-temporal colocaria essas informações na mente dele?

W

Wino era um conceito distante, mas podia pensar em hortas de quintal, peste ou Shakspeare. Como se sua mente estivesse se dissolvendo num mar de pensamentos do século XVI. O inconsciente coletivo é fundamental para a manutenção dos pensamentos de um único individuo. Não podiam captar isso com Gia, mas mesmo ela devia ter sentido algo diferente no ar. Abdicou dos planos de conhecer o passado; acaso se afastasse da nave, perderia o único elo que possuía com o futuro e logo seria absorvido pelo fluxo de pensamentos do passado. Se tornaria um deles em poucas horas, o que será que aconteceria com suas estrutura cerebral, ou mesmo com seus conhecimentos do futuro? Será que emergeria enquanto um gênio ou um sensitivo? Melhor não saber. Fechou-se na nave, ainda bem que não tinha sido arrogante o suficiente para rejeitar o equipamento de decolagem automático, logo não conseguiria sequer saber o que fazia ali dentro.

X

Xarope amargo descia pela garganta e embrulhava o estomago. Precisava disso para dormir, não podia lidar com o fluxo de informações. Logo retornaria para casa, logo estaria distante o suficiente das pessoas para parar de sentir a sua mente ser violada por informações que não faziam sentido. Sua missão já estava cumprida, havia enterrado a caixa preta com informações sobre a viagem, as pessoas do futuro saberiam de tudo. Agora precisava dormir, tinha de aguardar algumas horas até que o buraco se tornasse atingível dali. Teria de confiar nos instrumentos, e sequer ousou olhar se havia combustível suficiente.

Y

Yagi alterada estava posicionada, os instrumentos seguiriam a trilha de tijolos amarelos assim que aparecessem. Tentava se lembrar do futuro, mas só sentia medo. O amargo da boca e a náusea velariam seu sono até em casa.

Z

Zão-zão, era o barulho dos motores funcionando. O combustível do motor iniciou a combustão interna nuclear que fez a nave subir. A medida que adentrava o espaço, ele se sentia mais feliz, livre de lembranças confusas que não fazia parte dele.

* Experiência muito tosca que eu fiz a algum tempo atrás. A regra era óbvia: redigir um texto sendo que a primeira palavra de cada parágrafo devia começar com um letra do alfabeto. Além de eu ter sido extremamente condescendente com várias passagens só fiz dois textos. nao tenho disciplina nenhuma para escrever...

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